O acupunturista
velho
BRASÍLIA, JULHO DE 2016 – Sou
aluno do Curso de Medicina Tradicional Chinesa da Escola Nacional de Acupuntura (ENAc).
A maioria dos meus colegas são jovens, inclusive os professores; boa parte
deles são pessoas de meia idade, e alguns são idosos. Talvez eu seja o mais
velho, 62 anos. Outro dia um colega ficou preocupado comigo, pois, no seu
entendimento, firmar-se como acupunturista pode levar 10 anos; então, eu
estaria com 72 anos. Expliquei-lhe que não me preocupo nem com amanhã, quanto
mais com 10 anos.
A
eternidade é agora; a minha curtição é agora. Só as centenas de pacientes que
já atendi voluntariamente, e o sorriso que ganhei de presente de muitos deles,
valem mais do que 50 anos de mercado.
Para
mim, o significado de juventude é único. Sinto-me, inequivocamente, espírito, e
no mundo espiritual não existe a dimensão do tempo. O corpo se submete às leis
da matéria: espaço – altura, largura e espessura –, tempo, força de gravidade e
código genético. De modo que chega um momento em que até as pessoas mais
saudáveis, mais fortes, mais cheias de vitalidade, vão esmorecendo, perdendo o
viço, encolhendo, murchando, esfarelando-se, o rosto vai ficando como maracujá
de gaveta, as juntas vão emperrando, o coração se esforça desesperadamente.
Velhice é a aproximação da morte.
Às
vezes, aparece uma rosa que incendeia o coração, e então o Qi da alegria
transforma de novo a vida num jardim, e sentimos que a eternidade é agora,
intensidade, poesia, vida. A vida jamais se extingue; o que se extingue é a
matéria, a matéria sem a vida – átomos.
Os
jovens não sabem disso. O que os jovens sentem é que são fisicamente imortais,
talvez porque ainda não despertaram para o mundo espiritual. Os jovens são
também imortais por causa da beleza inerente à juventude; a beleza é imortal
por si mesma, contêm a eternidade das rosas.
Caro
colega, já estou descendo a ladeira, sem freio, mas essa velocidade é nada
perante o cheiro azul do mar, o perfume das virgens ruivas, as asas da luz.
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••• RAY CUNHA – Escritor e Jornalista baseado em
Brasília-DF, Brasil, e o mais antigo colunista do Jornal do Feio
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