Escritor apresenta romance como trabalho de conclusão do curso de
Medicina Tradicional Chinesa da Escola Nacional de Acupuntura (ENAc)
MARCELO LARROYED
Escritor e mestre em Teoria Literária pela
Universidade de Brasília
BRASÍLIA, 15 DE DEZEMBRO DE 2016
– O romance FOGO NO CORAÇÃO, de Ray Cunha, foi publicado hoje no Clube de Autores. Após pedido, o livro chega ao endereço do
comprador em torno de uma semana. FOGO NO CORAÇÃO é como um iceberg. Na parte
submersa, move-se o universo da Medicina Tradicional Chinesa, alicerçando a
trama da novela: O delegado de Repressão a Homicídios, Ricardo Larroyed, também
acupunturista e professor no Instituto Holístico, investiga o suicídio e o
assassinado de três modelos de moda, ocorridos ao longo de 2016, em Brasília.
Todas elas eram pacientes em acupuntura, sendo que duas delas foram atendidas
no Instituto Holístico. O principal suspeito é o professor do Instituto
Holístico, mestre em artes marciais e poeta Emanoel Vorcaro, sócio de Ricardo
Larroyed na Clínica de Terapias Holísticas, onde Vorcaro atende a estonteante
modelo Rosa Nolasco.
FOGO
NO CORAÇÃO é ambientado no dia-a-dia do mundo da Medicina Tradicional Chinesa.
Por trás da trama, fluem várias questões vivenciadas por quem estuda, leciona
ou trabalha no âmbito da MTC. Por isso, Ray Cunha adverte: “Todas as
personagens desta novela são fictícias, assim como a ambientação foi inventada,
com exceção do escritor, pesquisador, psicanalista e acupunturista Jorge Bessa,
que também trabalhou na área de inteligência e serviu ao Brasil em Moscou.
Bessa aparece no romance com um perfil biográfico ligeiramente modificado;
trata-se de uma homenagem a um amigo que tem minha admiração, especialmente
pelo seu trabalho de pesquisa no campo espiritualista”.
É
a primeira vez que um aluno de MTC apresenta como trabalho de conclusão de
curso uma peça de ficção. Tudo começou na primavera de 2013, quando, orientado
por Jorge Bessa, o jornalista e escritor Ray Cunha começou o curso de Medicina
Tradicional Chinesa na Escola Nacional de Acupuntura (ENAc),
em Brasília. Durante o curso, ele observou que o grande desafio dos
acupunturistas no Brasil é o desconhecimento, por parte da população, das
técnicas da MTC.
Foi
assim que resolveu desafiar a tradição da academia e apresentar um inusitado,
surpreendente, trabalho de conclusão de curso, orientado pelo
professor-acupunturista Ricardo Antunes, com a missão de divulgar a Medicina
Tradicional Chinesa, essa ilustre desconhecida no Brasil, inclusive vista por
muitos, ainda, como bruxaria. O autor entendeu que um romance com foco no
universo da MTC tem o poder de divulgar essa filosofia e ciência terapêutica na
mesma medida do sucesso editorial da novela.
Neste
contexto, FOGO NO CORAÇÃO aborda várias questões no âmbito da MTC, desde o
estudo de caso de uma paciente de mioma até a técnica de inserção de agulha e
questões existenciais e transcendentais, como o misterioso Qi, numa abordagem
ampla do que é a Medicina Tradicional Chinesa.
RAY
CUNHA é autor dos romances HIENA e A CONFRARIA CABANAGEM e das novelas NA BOCA DO JACARÉ, INFERNO VERDE (que integra o livro O CASULO EXPOSTO) e A GRANDE FARRA (edição esgotada).
E-mail
do autor: raycunha@gmail.com
Foto: Rodrigo Cabral/2012
“Em
conversa com uma colega major, que fazia o Curso de Medicina Tradicional
Chinesa no Instituto Holístico, Francisco Nolasco foi orientado a levar sua
irmã, Rosa Nolasco, para ser atendida, segundo a major, pelo professor mais
brilhante do curso, Emanoel Vorcaro. Rosa Nolasco era
tão linda que os homens com o dom do olhar clínico desejavam engoli-la, engravidar-se dela, e sentir o eterno e intenso triunfo da maternidade. Brasiliense da gema, filha de diplomata americano e uma potra de Belo Horizonte, era dessas mulheres que param o trânsito, literalmente, daí porque raramente são vistas caminhando na rua; escondem-se em automóveis indevassáveis, de onde saltam para atravessar apenas uma calçada, sempre de óculos escuros. E seu elemento é a noite. Ruiva, os cabelos caindo como ervas daninhas numa cascata caudalosa até ancas africanas – herança da mistura entre um lusitano e uma princesa moçambicana em uma geração bem anterior à sua –, a pele rosada, olhos verdes como folhas de jambu, lábios grandes, grossos e vermelhos, nariz arrebitado, e um sorriso que era uma queda para cima, foi estuprada a primeira vez aos 14 anos, idade em que a mulher ainda é criança, prestes a se transformar em borboleta. Depois dessa primeira vez, o autor, um tio de 40 anos, estuprou-a mais oito vezes, até ela engravidar e ser conduzida a um matadouro, onde sangrou a ponto de quase morrer, resgatada pelo seu irmão, Francisco Nolasco, major da Polícia Militar do Distrito Federal, atirador de elite. O tio, um tal de José Antônio, foi encontrado com os bagos e o pênis destroçados a tiros e uma bala na hipófise, flutuando no Lago Paranoá, onde, a bordo de um iate, promovia bacanais pantagruélicas. Aos 17 anos, Rosa, uma flor de 1,80 metro e 70 quilos, iniciava a profissão de modelo, em plena tragédia, pois quase todo mundo que gravitava em torno dela queria predá-la, incluindo mulheres invejosas, mas seu maior predador era ela mesma. Passara por muitas camas, abortos e a exploração mais abjeta, porém seu corpo tinha a invulnerabilidade das rosas, que são frágeis, mas eternas. Sua tragédia perpassava pelo histórico das mulheres da família: o mal instalara-se com fúria no seu útero: uma colônia de miomas.
tão linda que os homens com o dom do olhar clínico desejavam engoli-la, engravidar-se dela, e sentir o eterno e intenso triunfo da maternidade. Brasiliense da gema, filha de diplomata americano e uma potra de Belo Horizonte, era dessas mulheres que param o trânsito, literalmente, daí porque raramente são vistas caminhando na rua; escondem-se em automóveis indevassáveis, de onde saltam para atravessar apenas uma calçada, sempre de óculos escuros. E seu elemento é a noite. Ruiva, os cabelos caindo como ervas daninhas numa cascata caudalosa até ancas africanas – herança da mistura entre um lusitano e uma princesa moçambicana em uma geração bem anterior à sua –, a pele rosada, olhos verdes como folhas de jambu, lábios grandes, grossos e vermelhos, nariz arrebitado, e um sorriso que era uma queda para cima, foi estuprada a primeira vez aos 14 anos, idade em que a mulher ainda é criança, prestes a se transformar em borboleta. Depois dessa primeira vez, o autor, um tio de 40 anos, estuprou-a mais oito vezes, até ela engravidar e ser conduzida a um matadouro, onde sangrou a ponto de quase morrer, resgatada pelo seu irmão, Francisco Nolasco, major da Polícia Militar do Distrito Federal, atirador de elite. O tio, um tal de José Antônio, foi encontrado com os bagos e o pênis destroçados a tiros e uma bala na hipófise, flutuando no Lago Paranoá, onde, a bordo de um iate, promovia bacanais pantagruélicas. Aos 17 anos, Rosa, uma flor de 1,80 metro e 70 quilos, iniciava a profissão de modelo, em plena tragédia, pois quase todo mundo que gravitava em torno dela queria predá-la, incluindo mulheres invejosas, mas seu maior predador era ela mesma. Passara por muitas camas, abortos e a exploração mais abjeta, porém seu corpo tinha a invulnerabilidade das rosas, que são frágeis, mas eternas. Sua tragédia perpassava pelo histórico das mulheres da família: o mal instalara-se com fúria no seu útero: uma colônia de miomas.
“Quando
Rosa Nolasco chegou, o professor Emanoel Vorcaro a aguardava. Ele dividia seu
tempo entre a Universidade de Brasília, o Instituto Holístico, a Clínica de
Terapias Holísticas e sua casa, na 703 Sul. Estava lendo alguma coisa quando os
irmãos entraram no consultório. Vorcaro deixou de lado o que estivera lendo e
pousou os olhos mortos nos olhos dela, e assim permaneceu por tempo excessivo,
como um especialista em iridologia perscruta a alma do paciente, mergulhando
nos subterrâneos labirínticos, nos pântanos, nas pradarias, nos jardins, no
sol, nos olhos de Rosa Nolasco, que, de manhã, assumiam uma nuança azul; à
medida que o dia avançava, e quanto mais calor fizesse, então as esmeraldas
surgiam em meio aos arbustos rubros; e, à noite, eram como jambu, prenhes de
espilantol. Emanoel Vorcaro gemeu. Provavelmente o gemido foi mental. A eternidade
daqueles segundos o inebriara: sentiu cheiro de mar, ouviu risos de crianças, a
voz de Frank Sinatra em alguma alcova perdida na paisagem vista da janela
daquele quarto de hotel, em Paris, ao cair da noite, naquele momento e
condições que tornam gentil todo o mundo, e viu sua esposa com seu filho
imaginário no colo, rindo o riso cristalino das mulheres lindíssimas, e que o
perseguia aonde quer que fosse.”
♦♦♦
••• RAY CUNHA –
Escritor e Jornalista baseado em Brasília-DF, Brasil, e o mais antigo colunista
do Jornal do Feio
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