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5/04/2006

Doze anos sem Paulo Carvalho


Nesta quinta-feira, 5 de maio, se estivesse vivo, o jornalista Paulo de Souza Carvalho estaria aniversariando. Paulo - o nosso Magrão - que completou 12 anos de falecimento no passado dia 9 de fevereiro, foi um grande mestre e companheiro. Falar desse homem, é falar da própria história do jornalismo paraense. Dos 65 anos de vida, mais da metade foi dedicado à atividade de Gutemberg. Ele foi o responsável pela formação de uma legião de profissionais, que atuam nos mais diferentes campos do jornalismo e da publicidade no Pará. Com o seu jeito carinhoso e ao mesmo tempo exigente, emprestava o melhor de si para ajudar os que iniciavam nas lides de imprensa.
Foi assim no Imparcial Esportivo, cuja secretaria ocupava, revezando ora com Ossian Brito, ora com Thomaz Nunes: no Flash, onde teve passagem rápida, cobrindo as ausências daHelena Cardoso; e na Folha do Norte, na função múltipla de redator /revisor/ “penteador de telegramas” da Asapress, Transpress, DPA, Ansa e UPI (alguns vinham em inglês e espanhol e ele tirava de letra!) e por vezes editor, pois sabia de cor todos os corpos (comuns, cerifados e itálicos), das linotipos da velha oficina das Folhas, principalmente da APL, uma máquina que fazia títulos dos corpos 48 até 120, usados normalmente na página literária do Eliston Altmann, publicada aos domingos na capa do 2º caderno. Paulo Carvalho permaneceu na Folha até o seu fechamento.
Bom papo e boêmio – não raramente, após o fechamento da edição da Folha, Paulo Carvalho se reunia com alguns companheiros no “Bar do Espanhol” – a poucos metros do prédio do jornal, quase na esquina da 1º de Março – para tomar umas cervejas, acompanhados de "tira-gostos" feitos especialmente para ele na base do peixe “escabeche”. Os participantes dessas cervejadas eram especiais. Paulo Carvalho sabia escolher as suas companhias.
Romântico, apreciava a boa música, principalmente as criações de Vinícius de Moraes, como por exemplo, “Eu sei que vou te amar” e “Samba em Prelúdio”. Um mês antes de falecer, nas horas ociosas da redação do Jornal Popular - seu último jornal -, ou mesmo num barzinho próximo, na Rua 28 de setembro, ele ainda curtia (e cantava) essas músicas, acompanhado pelo cartunista Marco Bleuris D’ Queiroz, ao violão.
Autodidata, Paulo Carvalho conseguiu superar-se. Entendia o vernáculo como nenhum outro titulado em letras. Até jocosamente seus companheiros o apelidavam de “dicionário ambulante”. Consta, e isso não é folclore, que de certa feita, residindo no Rio de Janeiro, arrumou uma confusão com Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, autor do Dicionário da Língua Portuguesa, por discordar do significado e grafia de duas palavras ligadas à nossa Região, contidas numa das edições da obra. A coisa rendeu; mas, nas edições futuras, o velho mestre – de saudosa memória – cedeu às ponderações de Paulo Carvalho e retificou as palavras.
Apaixonado pelo jornalismo, cresceu na profissão e entendia todos os assuntos que lhe propunham. Dono de um caráter exemplar, homem sério e rigorosamente honesto, além de estudioso e esforçado, ainda jovem aprendeu a ler, traduzir e falar inglês e francês, principalmente esse último idioma.
Esteve um longo tempo no Rio de Janeiro, onde atuou nos jornais O Globo e Jornal do Brasil, com rápida passagem pelo vespertino Última Hora, convidado por Ari de Carvalho, falecido - pouco antes de fechar – e pela Livraria Hachette do Brasil (no antigo endereço da Rua Décio Vilares, 178 – Bairro Peixoto – Copacabana), que representava no Brasil o matutino francês Le Figaro, onde fazia as traduções dos despachos e documentos que vinham diretamente de Paris, além de artigos e crônicas de jornalistas franceses, o quais distribuía para os jornais cariocas. Também andou rapidamente por São Paulo, atuando em alguns jornais.
Apaixonado por Belém, abriu mão da vida pacata (e boêmia) que levava no Rio de Janeiro e retornou à nossa cidade. Colaborou com vários jornais sem caráter de exclusividade; editou O Tablóide, um mensário quente e polêmico como seu criador, e que teve uma vida efêmera; até que em 1982, juntamente com Sillas Ribeiro de Assis, falecido – seu velho companheiro de redação das Folhas e de ideais, tornou realidade o projeto do Jornal Popular.
Paulo Carvalho morreu trabalhando, como aliás, sempre desejou: “Quero morrer diante de uma máquina de escrever”, - haja vista, que nunca se adaptou ao modernismo da computação – dizia sempre. Ele morreu em pleno exercício da profissão que escolheu, vítima de um câncer provocado por uma vesícula malvada.
Como todo jornalista, tinha dois vícios: fumo e bebida...além do amor e da beleza dos textos que produzia. O velho coração que amou tanto o jornalismo, como os pupilos, os amigos e as mulheres - na sua juventude, bem entendido – deixou de funcionar.
Paulo Carvalho, o chato, o enjoado, o exigente e turrão está fazendo falta.
Jorge Nascimento, repórter-fotográfico – o nosso querido Paquinha -, uma das “crias” do grande morto, é um dos que mais sentiram a sua morte. Paulo Carvalho chegou publicar uma gostosa crônica dedicada a ele, com o título “As Desventuras do Jorginho” onde analisava as dificuldades de quem se inicia no jornalismo, do “foca”.
Aliás, não apenas o Jorge, mas muita gente que o magrão com cara de “curica”, - como era carinhosamente chamado na Folha do Norte – formou com o seu exemplo, ensinamentos e proteção lembram com saudade do grande jornalista.
Paulo Carvalho era demais. Culto, inteligente, fora-de-série. Como todo gênio morreu simples. Ele, se vivo estivesse, vibraria com a nova fase do jornalismo paraense, tudo na base da automação. Como disse o compositor Sérgio Bittencourt, “amigo de copo” de Paulo Carvalho nas noitadas do Baixo Leblon, e que também já retornou ao Pai – "naquela mesa esta faltando ele, e a saudade dele está doendo em todos nós", que fazemos - ou tentamos fazer - o bom jornalismo.
Paulo Carvalho, onde você estiver, receba o carinho e a homenagem de seus antigos pupilos, inclusive o redator deste blog.
Nunca o esqueceremos. A.F.

Um comentário:

Anônimo disse...

Feio,
Como sempre vocêé e incrível.
O texto - com forte dose de emoção - está muito bom.
Acredito que o "Magrão" tenha gostado, como nós gostamos.

Maria Tereza de Noronha Lins, nome de solreira, claro.
(ex-colega da Folha do Norte)