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7/28/2007



A LETARGIA DE LULA

Carta de um intelectual do Pará

Brasília - Em carta a este colunista, o diplomata José Varella, presidente da ONG Universidade Livre do Marajó, medita sobre o artigo “A letargia de Lula” - publicado antes ... e não contemplado por este blog, já que a minha coluna neste espaço é semanal. Como a missiva de José Varella contribui para o debate político e aborda a questão amazônica, objetivo maior do Enfoque Amazônico, achei por bem publicar a epístola do intelectual paraense, a qual se segue.


Estimado conterrâneo e colega Ray


Permita-me divergir do seu artigo “A letargia de Lula”, para assinalar o vício maniqueísta da mídia nacional formada desde a escola até às redações em amar ou odiar o "rei" provisório, eleito para Presidente...

Dessa longa série fizeram melhor o papel Vargas, que foi mais realista do que o Príncipe (o poder), com sua vocação dramática até o suicídio; e Juscelino, com seu ar de seresteiro e a minerice de imperador do Egito ao lado do sumo-sacerdote Oscar Niemayer, Lúcio Costa e o vidente de Monte Claros, Darci Ribeiro, que viria depois com a utopia tropical da UnB, abatida em pleno vôo e castrada pelo golpe de 64...

O mal é de nossos usos e costumes colonizados no caldo de cultura ibérico em luta permanente entre Deus e o Diabo (lembre-se, por exemplo, da festa de Mazagão, com seus mouros e cristãos se engalfinhando por causa da doidice marroquina d'el-rei dom Sebastião, lá no Amapá...).

Você fala numa corrente filosófico-religiosa que vem de berço oriental e tem grande penetração no Ocidente cristão através de imigrantes japoneses. Esse caldeamento de corpos e espíritos diversos que vem na contramão de toda e qualquer ortodoxia, e faz a nossa mestiçagem brasileira, é a grande novidade no mundo. Pois aí está a abertura para a convivência e a tolerância mútua, única saída para um mundo supercomplexo.

Não bote todo esse enorme abacaxi pra descascar no colo de um Presidente na solidão do Planalto...

De fato, entre o que a nossos olhos parece "branco" ou "preto" há uma gama enorme de variações de tonalidade... Não sou do PT nem lulista roxo, mas é injusto (para não dizer preconceituoso) o nível de ataques ao atual presidente da República, que descamba do necessário debate crítico para a desqualificação abusada. Tudo indica, será pior à medida que 2010 se aproximar com ensaio geral em 2008...

Tá todo mundo louco! Doido para o "piloto" sair de cena (nenhuma hipótese de sabotagem pode ser afastada, mesmo com risco do Jabor com cara de santarrão fanfarrão da TV invocar a tese da paranóia governamental)...

Dane-se o Brasil, o que uns e outros querem é “Puder”!...

No fundo, todos adoravam o falecido ACM (que Deus o tenha e não vá ele encrencar agora com a gestão do chaveiro do Céu pra lhe tomar o cargo; já pensou o que poderia acontecer com o arquiinimigo Waldyr Pires quando chegar o seu dia e se apresentar na portaria celestial? E a tremenda revanche da discussão com seu colega senatorial Barbalho sob as barbas de São Pedro?)...

ACM chamou de ratazana ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (ao qual apoiara na eleição presidencial pra fazer ciúmes a FHC e se vingar de José Serra, atropelador da candidatura da filha do amigo Sarney); a plebe rude queria ver sangue, mas o Lulinha paz e amor venceu o sapo barbudo muito bem, e assim, entre mortos e feridos, todos se salvaram... Pontos para o presidente Lula.

A turma está vendo a floresta, mas não enxerga a árvore. Não é verdade que a Amazônia é algo remoto para Lula: ele estava lá pelas bandas de Xapuri quando o comuna Chico Mendes estava em apuros sob a mira dos fuzis do latifúndio e ninguém no Sul Maravilha tinha ouvido falar de uma futura ministra Marina Silva...

O buraco da camada de ozônio é mais embaixo, no subsolo... Lá no teu, no meu, nosso Amapá, estavam passando contrabando de material radioativo extraído das beiras da Serra do Navio... Levado em sacos ordinários em caminhonetes através da GF... Suspeita-se que iam parar no Oriente Médio; jornalistas na outra margem do Oiapoque levantaram suposta informação de que à França restou o minério atômico em questão no atol de Mururoa, naquela experiência em que foi afundado o navio do Greenpeace e morreu a bordo na explosão provocada pelo serviço secreto um militante português...

O mundo ficou "jito", mas o Oiapoque é longe do Brasil primeromundista... Um Lula lá tem só uma agenda de 24 horas ao dia, tirando o cerimonial, o protocolo e as viagens... O que é que sobra para "tomar conta" deste país imenso? Não há Presidente que possa, é preciso o Super-Homem, mas o que havia no cinema caiu do cavalo e fraturou a coluna... Já não se fabricam mitos como no tempo da Cobra Grande...

O que acontece é que Brasília - nascida de um sonho de integração continental - se transformou no reino da Lua (culpa dos congressistas que a gente manda pra lá), longe da Amazônia e das mais regiões dos Brasis...

Qualquer patriota que venha, por exemplo, lá dos Pampas, como Jango, ou de Mecejana, como o cearense Castelo Branco, acaba sendo envolvido pela solidão do Cerrado, um certo espírito celestino, longe da materialidade da terra em transe...

Não podemos vaiar o Lula sem vaiar a nossa própria sociedade bacana vidrada em Miami e adjacências, a mediocridade nacional em assumir de fato este país-continente. É nossa culpa - há quase 400 anos - se a Amazônia é longe do Brasil e do mundo. Somos nós, os brasileiros do Norte, que temos que amazonizar o Brasil. Sei que você está aí batalhando com o nome Amazônia na capital da República...

Mas é o sistema presidencialista, irmão. Perfeito motivo para manter a alienação política da nação... Os espertos nos ensinam, mirem-se no Tio Sam... Sim, eu adoraria trazer de lá, por exemplo, a DEMOCRACIA MUNICIPAL, que está à base da velha democracia americana que Tocqueville invejava, para aplicar na imperial e aristocrática França... Apenas remediada agora com a União Européia e o PARLAMENTARISMO moderno...

Em BSB falam em reforma política, mas quem vai reformar o quê? Time que está ganhando... Lembre-se de Jango, Janio, Collor... FHC, segundo Elio Gaspari, este último estava seqüestrado no porão do Planalto e o sósia dele mandava esquecer tudo que havia escrito.

Movidos pela mídia entreguista, a minha geração votou (eu não, graças a Deus estava nas ruas de Belém com carro de som gritando Lott-Jango...) no destrambelhado agente yankee Janio (aquele da vassoura de bruxa, varre-varre vassourinha anti-corrupção, querendo dar o golpe que viria, depois, dos quartéis, você era jovem e não se lembra da imortal UDN, avó da Arena et caterva com o espelho da moralidade burguesa à mão), quando era para eleger o general nacionalista Lott, que tinha impedido o golpe e segurado Juscelino...

Humberto de Alencar Castelo Branco poderia ter sido o nosso Hugo Chávez, mais sizudo, mais sertanejo do que Lula, talvez; mas o bacharelismo burguês e a famosa "esquerda burra", que não lembrava que o tenente Luiz Carlos Prestes tinha atravessado o país a pé, o Cavaleiro da Esperança, pisou na bola e lá se foram os anos de chumbo, desde um 1968 pelo avesso do 68 de Paris...

Lula está refém (Zé Genoíno, Dirceu e outros pagaram pra ver, mas até os tapetes do Planalto sabiam que era inevitável, dizem que o palácio Alvorada é visagento, deve ser alma penada de algum bandeirante tipo Anhanguera, que andou matando índio pelos sertões de Goiás) dos usos e costumes da poderosa elite neocolonial. Esta, com seus "representantes do povo" no Congresso, não quer nem ouvir falar em governo parlamentar... ficaria exposta, entende? Carece de um "rei" momo, de tempo em tempo...

Logo, um homem do Povo na Presidência é alvo fácil para distrair as massas e dizer, vejam como não dá certo! Suspiros pela volta de Dom Pedro II, a cada erro de concordância gramatical do Lula é o Presidente que leva palmada...

Pannis et circens... Mas, como diz o pragmático vice José Alencar, Lula é um gigante... O homem certo no lugar certo, na hora incerta. Não embarque nessa, amigo.

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