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7/25/2008

AMAZÕNIA
EcoDebate tece críticas a declarações do coronel Gelio Fregapani

Brasília – A missão da coluna Enfoque Amazônico é noticiar, repercutir e ampliar o debate em torno da questão amazônica. Assim é que encontrei, no Google, um excelente momento desse objetivo, nos comentários de Henrique Cortez e Telmo Heinen sobre a entrevista A Amazônia será ocupada. Por nós, ou por uma ou mais potências estrangeiras, que fiz com o coronel Gelio Fregapani e publiquei em 25 de fevereiro de 2005.
Fregapani é o mentor da Doutrina Brasileira de Guerra na Selva, fundador e ex-comandante do Centro de Instrução de Guerra na Selva, e serviu ao Exército durante 40 anos, sempre ligado à Amazônia. Na entrevista, ele declarou: “Se nós plantarmos 7 milhões de hectares de dendê na Amazônia, extrairemos 8 milhões de barris de biodiesel por dia, o que equivale à produção atual de petróleo da Arábia Saudita.

”Internacionalização da Amazônia"

Diz Henrique Cortez: “A entrevista deve receber dois tipos de comentários: um, relativo à opinião relacionada à doutrina da segurança nacional, que tentarei discutir em seguida; e outro relacionado aos números e potencialidades do dendê, do biodiesel, etc., realizado com precisão pelo Telmo Heinen. Os leitores e leitoras avaliem, reflitam e tirem as suas próprias e conscientes conclusões”.

Seguem-se, ipsis litteris, os comentários de Henrique Cortez, coordenador do blog.ecodebate.com.br.“Nossa opinião já foi expressa no editorial “O mito da internacionalização da Amazônia”, de 1 de fevereiro de 2008 (in http://blog.ecodebate.com.br/2008/02/01/o-mito-da-internacionalizacao-da-amazonia-artigo-de-henrique-cortez/), mas algumas questões e observações precisam ser reafirmadas.
“É uma entrevista risível, com uma análise paranóica-xenófoba, com a perspectiva militarista, “prima” ideológica de todos os “falcões” militares do mundo, que garantem a sobrevivência e as verbas com pseudo-ameaças. Os militares norte-americanos também pensam assim. O militarismo apenas se justifica com potenciais inimigos internos ou externos, ou ambos.
“A criminalização dos movimentos sociais segue a lógica de que índios, quilombolas, sem-terra, ambientalistas, ribeirinhos, atingidos por barragens, extrativistas, etc, são ameaças à segurança nacional, exatamente porque resistem a este modelo de desenvolvimento exploratório e insustentável.
“O discurso do risco de internacionalização, com invasão pelos marines e tudo mais, apenas serve à direita desenvolvimentista. É importante lembrar que a ditadura militar cansou de usar o pseudo-argumento “Integrar para não entregar”, na tentativa de justificar a ocupação desordenada da Amazônia, raiz de sua devastação.
“O Brasil não sofre reais ameaças de inimigos externos. Os maiores danos e as maiores ameaças são nossas mesmo, a começar pelos desenvolvimentistas a qualquer custo, estes sim a serviço das grandes corporações transnacionais.
“Todos os recursos da Amazônia, a nossa e dos outros, já está à disposição do mercado internacional, tendo em vista a perpetuação de nossa pauta colonial de exportação de produtos primários, que corresponde a mais de 90% de nossas exportações. Ninguém precisa nos invadir simplesmente porque já vendemos tudo aos “melhores” preços, sem que isto tenha realmente contribuído para a melhoria dos indicadores sociais e econômicos da região.“
Os “nacionalistas”, defensores incondicionais da expansão da fronteira agropecuária para a Amazônia, sempre reforçam a idéia de que o Brasil pode alimentar o mundo, ou seja, são defensores que o Brasil seja uma “fazendona” à serviço do mundo, do mesmo modo que é desde o período colonial. Pensando bem, não é difícil perceber quem, de fato, está à serviço dos interesses internacionais.
"Além dos discursos e bravatas pouco ou nada fazemos de real pelo desenvolvimento sustentável da Amazônia, da nossa e dos nossos vizinhos, além de não temos uma verdadeira estratégia de integração com os demais países amazônicos.
“Para que a “nossa” Amazônia seja realmente nossa, precisamos retoma-la dos grileiros, madeireiros ilegais, agro-gananciosos, garimpeiros ilegais e outros devastadores, incluindo políticos que ainda agem como donatários das Capitanias Hereditárias. Ela será nossa na exata medida em que formos efetivamente responsáveis pelo seu destino.
“Não creio que corremos o risco real de ter a “nossa” Amazônia invadida em prol da governança global, mas certamente teremos problemas nas relações multilaterais, no acesso aos financiamentos internacionais e no boicote aos nossos produtos e serviços, inclusive justificando uma renovada onda protecionista. Este é um risco real e imediato.
“Não há como negar que seremos cobrados e muito. Cobrados e com razão. Mas ainda temos tempo e oportunidade de dizer a nós mesmos, antes de dizer ao mundo e aos nossos vizinhos, que somos capazes de agir com responsabilidade e seriedade.
”Henrique Cortez, ambientalista, coordenador do portal e do blog EcoDebate.
Biodiesel
Agora, os comentários de Telmo Heinen, colaborador do EcoDebate, ipsis litteris.
“De onde surgiu esta conta de 8 milhões de barris de biodiesel por dia em 7 milhões de ha de dendê ?
“Prezados Ray Cunha e Coronel Fregapani,
“Eu gostaria de entender a conta que fizeram para estimar a cifra acima porquanto a produção “ótima” do dendê (Palma Africana) é considerada como sendo umas 8,0 t/ano ou seja, também umas 8,0 t de biodiesel.
“Sem levar em conta a densidade de 920 kg por metro cúbico e, considerando que um barril contém 159 litros, para se atingir os oito (8) milhões de barris de biodiesel por dia, algo como 1,272 milhão de t/dia, então em um ano de 365 dias seriam necessários cerca de 464,280 milhões de toneladas e portanto, produzindo-se aproximadamente umas 8,0 t de biodiesel por hectare, seriam necessários 58,035 milhões de ha de dendê para empatar…
“A grande pergunta no entanto não é esta. O que todo mundo quer saber é quantos hectares seria necessário plantar para substituir todo óleo diesel, gasolina e querosene de aviação que o mundo consome?
“O parâmetro que temos é o consumo de cerca de 85 milhões de barris de petróleo por dia, entretanto os combustíveis refino-resultantes não atingem oito (8,0) milhões de toneladas por dia (diesel, gasolina, querosene) e em 365 dias precisa-se de 2,920 bilhões de toneladas/ano e aí sim produzindo-se 8,0 t de biodiesel por hectare, seriam necessários 365 milhões de hectares…
“Evidentemente que a conta não é tão simples assim, temos o álcool para descontar, temos também que um (1,0) litro de óleo rende muito mais quilômetros do que um (1,0) litro de gasolina, etc… etc…
“Em outras palavras, o mundo precisaria processar o dendê de 1,0 milhão de hectares por dia… para fazer rodar todos os veículos e naturalmente abandonar a geração de energia elétrica a partir do petróleo bem como utilizar outras fonte de aquecimento residencial como lenha (madeira) briquetada, solar etc…
“Além disto não necessitamos ficar exclusivamente no dendê. Temos a Macauba e além disto Leucena, Moringa, Tungue, Pinhão Manso, até Pequizeiro serve e tantas outras para cultivo em outras partes do mundo. Temos sobretudo diversas formas de geração de energia mormente a microgeração“.
Tamanho da região Amazônica: Mais de 500 milhões de hectares entretanto já existem muitas regiões devastadas na face da terra, degradadas, aguardando recuperação talvez via produção de energia, que a ocupação amazônica não necessita sair do racional.
“Bioplásticos viriam de outras fontes e o óleo de mamona substituiria os óleos lubrificantes.“Aguardo retorno.”Att, Eng. Agr. Telmo Heinen - Formosa (GO): http://www.noticiasagricolas.com.br/consultores.php?c=4
Resposta
O coronel Gelio Fregapani é autor do livro Amazônia - A grande cobiça internacional (Thesaurus Editora, Brasília, 2000, 166 páginas), no qual expõe, com clareza, sua visão geopolítica da Amazônia, certamente sob o prisma de um militar que conhece profundamente a Hiléia, sobretudo porque morou na selva, mas também porque é um leitor ávido da bibliografia sobre o Trópico Úmido. Se, porventura, ele errou nas contas, é verdadeira sua afirmação de que a silvicultura, especialmente para a produção de biocombustível, incluindo-se, aí, o bagaço de cana, é uma das opções ao petróleo, e que muito países estão adotando, incluindo-se a Alemanha, que extrai biodiesel de canola.
Quanto à polêmica sobre se a Amazônia será ou não invadida por um exército inimigo, só as circunstâncias geopolíticas dirão, mas uma verdade é clara: se São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília (que são o Brasil de fato) não formularem uma política de estado, a ser executada imediatamente, com rigor, de desenvolvimento sustentável das populações amazônidas, a Amazônia, que é a província potencialmente mais rica da Terra, será transformada em uma África do século XIX - O Coração das Trevas, como a definiu Josep Conrad.

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