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2/01/2008

José Wilson Malheiros


O ASSUSTADO

Um bom Carnaval para os leitores que gostam.
Já cansei dessas folias. Hoje em dia fico em casa, lendo ou vendo filmes.
Bons tempos em que minha mãe e demais amigas saíam no domingo carnavalesco pelas ruas de Santarém, vestidas com o inesquecível Dominó e uma pequena banda de música tocando as marchinhas da época. As pessoas eram mais puras, o mundo não estava tão violento assim.
Quando eu morava na Tapajônia, nós crianças ganhávamos um trocado e íamos comprar máscaras ou no Café Chic ou no “Seu” Sadi.
-Vamos sair de mascarado? E lá íamos nós pela rua batendo tambor e tocando apito.
Quando coincidia de passarmos pelo “Seu” Avelino, o Delegado, ficávamos trêmulos de medo. Ele mandava suspender as máscaras pra ver quem era.
- Eu sou filho de fulano, eu sou sobrinho da dona Sicrana etc. Todo mundo se conhecia na cidade. Depois ele mandava seguir.
As pessoas, naquele tempo, eram mais ingênuas e tinham medo de “mascarado fobó”. Sendo o mais velho, fui o único que brincou carnaval, de verdade, lá em casa. O resto da pirralhada ainda ficava nos cueiros, “vendo a banda passar”.
Admirava muito os blocos do “Pequim” e do “Barbeirão”, que saíam lá da “Vila Correia”, próximo de casa. Eram sambistas dos melhores e alegravam todo mundo com a batucada contagiante.
Minha primeira namorada, pra valer, foi um amor de carnaval. Fizemos, para dançar no Recreativo, o Bloco do Baralho.
Eu tinha mais ou menos dezesseis anos e era o valete de paus. Ela, a Rainha.
Todos os rapazes da cidade queriam ser o par, o súdito daquela rainha lourinha. Só eu consegui... Depois do carnaval minha soberana viajou, de vez, para o Rio de Janeiro e me deixou apaixonado. Nunca mais a vi.
Mais tarde passei de folião a músico. Toquei trompete em alguns bailes carnavalescos no conjunto Os Hippes. Mas o carnaval de hoje é diferente.
Um dos episódios que mais marcaram minha vida de carnavalesco aconteceu em Alenquer, no ano de mil novecentos e sessenta e cinco.
Na época era funcionário do Banco do Brasil (com muito orgulho).
Quando chegou o Carnaval o pessoal da cidade resolveu fazer um “assustado” na casa do aniversariante, o Gerente do Banco, Sr. Pedro Rubim.
Hoje já nem mais se fala nisso.
O Carnaval é outro. É uma indústria. Infelizmente também é tóxico e violência.
Um “assustado” é a maneira de se comemorar o aniversário de uma pessoa amiga, sem que ela saiba.
Juntam-se os amigos, compram-se os comes e bebes, contrata-se uma pequena orquestra e, de surpresa, aparecem todos na casa do aniversariante, onde dançam, comem, bebem e conversam até tarde da noite.
E assim aconteceu.
Eu nem sabia direito o que era aquilo. Ia “na onda” do pessoal. A reunião foi na rua da frente, perto do Trapiche, às margens do rio Suribiú. Bebida à vontade. Dali saímos para a casa do Gerente.
A sociedade “chimanga” comparecia em peso. Oracílio no Sax, China no Trombone, Carlão (Carlos Nogueira, advogado aposentado do BB) no violão.
Alguém descobriu que eu era músico e me deram outro Trombone.
Lá fomos nós tocando, bebendo, cantando e dançando pelas ruas naquela noite de luar até a casa do aniversariante que quase não foi suficiente para tanta visita.
“Ei, você aí... me dá um dinheiro, aí....”
“Ó jardineira porque estás tão triste...”
No Carnaval seguinte o Sr. Rubim estava deixando a gerência. Outro estava chegando.
Não houve mais “assustado”. Meu pai me contava que quando chegava um gerente novo para o Banco do Brasil, em Santarém, todo mundo ia ao Trapiche receber, carregar malas, abraçar etc.
Quando esse gerente ia embora, só os carregadores apareciam para carregar as malas... Mas não por “amizade”. Para receber uns trocados. A vida é assim.

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www.wilsonmalheiros.mus.br

2 comentários:

Anônimo disse...

Sensacional, Malheiros, comovente. Histórico.
Teu ex-parceiro de assustado.
C. Nogueira.

Anônimo disse...

Malheiros e Alvaro Jorge, juntos no teu blog? Parabéns. É demais para o meu coração.