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4/27/2008




ENTREVISTA/VICTOR FASANO
Rodovia ou ferrovia, qual o melhor para a Amazônia?


Brasília - O ator da TV Globo e ativista ambiental Victor Fasano, porta-voz do Movimento Amazônia Para Sempre - criado em 2007 por ele e os atores Juca de Oliveira e Cristiane Torloni, da TV Globo, durante as filmagens da série Amazônia, de Galvez a Chico Mendes -, participa de café da manhã promovido pela Frente Parlamentar Ambientalista, nesta quarta-feira 16, no décimo andar do Anexo IV da Câmara dos Deputados, e de audiência pública na Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara, às 10 horas de quinta-feira 17, no Plenário 8.
Victor Fasano veio à Brasília em parceria com a ONG Preserve Amazônia. O presidente da Preserve, Marcos Mariani, falará, no café da manhã, sobre “A importância do modal ferroviário na defesa dos direitos dos povos da floresta”, e, na audiência pública sobre a mudança, na Amazônia, do modal rodoviário para ferroviário, especialmente sobre os impactos sociais e ambientais decorrentes da pavimentação da BR-163, a Cuiabá-Santarém, bem como da falta de atendimento às exigências da legislação ambiental no licenciamento da obra.
Fasano concedeu a seguinte entrevista exclusiva à Agência Amazônia:

Qual é o objetivo do Movimento Amazônia Para Sempre?

Tornar conhecido o fato de que o nosso maior patrimônio está sendo destruído sem que a gente o conheça, sem que a gente tome o cuidado de preservar a maior floresta tropical do planeta, para que ela sirva de apoio para que o Brasil seja um país de futuro - e esse é o único futuro -; para que se respeite a Constituição (Artigo 225, Inciso IV), que é clara quando diz que a floresta amazônica só pode ser utilizada sob regras de controle ambiental rigorosas, o que não está acontecendo; a gente vê o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) passando por cima de um monte de exigências, o governo passando por cima de outras exigências e excluindo o Ibama (Instituto Brasileiro de Recursos Naturais Renováveis) de algumas decisões, enfraquecendo o movimento ambiental como um todo. As nossas florestas todas – no Sul, no Leste, no Sudeste, o Cerrado – foram quase totalmente destruídas, com a desculpa de que isso seria o futuro dos brasileiros com o plantio de álcool, de soja, disso, daquilo outro, e agora o mesmo modelo pretende-se utilizar na Amazônia, o que é um absurdo, pois não deu certo em nenhuma outra área do país.

Por que daria certo na Amazônia?

Nós temos a obrigação moral e política de defender essa floresta. Muitas vezes, a população não sabe o que está acontecendo, a população ouve a imprensa, que às vezes acompanha os fatos de forma rigorosa e às vezes é mais política, às vezes tem o rabo preso, como tudo no Brasil. Então, gostaríamos de passar para a população a importância da existência da floresta amazônica, para nós, que não vivemos lá, para os povos que vivem lá, que é uma diversidade enorme.

Obtido 1 milhão de assinaturas, como vocês pretendem pressionar o poder público?

O milhão de assinaturas é um número simbólico. Pretendemos entregar um manifesto ao presidente (Luiz Inácio Lula da Silva), com apoio de todas as pessoas que o assinaram; pretendemos também exigir do governo que as Forças Armadas comece a ter um papel importante na defesa da Amazônia, porque, afinal de contas, o nosso patrimônio está sendo aniquilado, roubado, e cabe às Forças Armadas defender-nos de nós mesmos. Defendemos o apoio à pesquisa para ampliar estudos sobre tudo o que pode ser produzido, obtido com a existência da floresta em pé. Mostramos que já existe uma área desmatada muito grande, na qual se pode plantar qualquer cultura, com a capacidade de dobrar nossa produção de grãos sem derrubar uma única árvore. E a gente pretende também fazer movimentos paralelos por meio do Ministério Público, do Congresso Nacional e da Justiça, com ações específicas, para que esses órgãos participem de uma só vontade, que é a vontade de preservar. Ninguém quer que não se produza grãos, não se crie gado ou que não haja meios de transporte, ninguém quer que a população brasileira seja prejudicada, todos queremos que o Brasil melhore, mas com consciência e que os moldes não sejam os mesmos utilizados em outras áreas que não deram certo. E ainda, queremos que os juízes que julguem os processos ambientais em curso tenham especialização em cultura ambiental, tenham conhecimento das leis aplicada ao meio ambiente e principalmente tenham conhecimento do meio ambiente em si.

O fato é que a Amazônia perde pelo menos 10 mil quilômetros quadrados de floresta por ano e isso revela absoluta falta de compromisso de Brasília para com a Hiléia.

Por sorte nós temos uma ministra (Marina Silva) interessada em meio ambiente, mas que não tem apoio do governo para efetivamente fazer o que ela gostaria de fazer. O Ministério do Meio Ambiente faz o que pode e não o que deve fazer.

Você é baseado no eixo Rio-São Paulo. Como é que você vê a Amazônia?

Vejo a Amazônia de forma diferente, talvez, do que a maioria dos brasileiros vêem. Eu tenho algum conhecimento científico, tenho conhecimento na área de espécies ameaçadas de extinção, de flora e fauna, então vejo que o que estão fazendo na Amazônia é o maior desperdício da Terra. Mas eu percebo que o brasileiro (de fora da Amazônia) acha que a Amazônia é muito longe, ele não entende a floresta amazônica, acha que é um monte de árvore que não serve para nada e que nunca afetará a vida dele no sul do país. Os brasileiros estão tomando consciência, agora, talvez devido às catástrofes no sul do país - ciclones, vendavais terríveis -, que a Amazônia influi diretamente no clima de todo o país.

O Brasil precisa da Amazônia para produzir biocombustíve?

Não, de jeito nenhum. A Amazônia não é para isso. As áreas que já foram devastadas da Amazônia serviriam para o plantio de essências amazônicas, castanha-do-pará, de dendê, de pupunha, plantas amazônicas, porque, sendo árvores, não vão interferir no clima. Agora, tirar uma grande massa de árvores e substituir por capim, no caso a soja, que não passa de um capim, isso vai interferir diretamente no clima, na incidência do sol na terra, na manutenção da umidade do terreno etc. Então, não precisamos da floresta amazônica para dobrar a quantidade de grãos que o Brasil produz, hoje.

Parece que o grande interesse de Brasília pela Amazônia restringe-se à construção de hidroelétricas?

Nos Estados Unidos estão destruindo algumas hidroelétricas porque perceberam que os rios estão morrendo. Se você dividir um rio em barreiras, em algum lugar faltará água. Hidroelétricas são sempre danosas, por isso o estudo de impacto ambiental tem que ser muito criterioso para se aprovar qualquer uma dessas hidrelétricas previstas no PAC. Hidrelétricas podem interferir na água dos países vizinhos, como, por exemplo, a Bolívia, que está reclamando do projeto das hidrelétricas no rio Madeira, que nasce na Bolívia.

O governo brasileiro deveria investir em que tipo de matriz energética?

A gente pensa em energia nuclear como uma coisa perigosa, mas quando é bem feita vem funcionando há muitos anos. Só ocorrem problemas quando os estudos e as obras são mal calculados. Mas há tanta maneira de se produzir energia – eólica, solar... O fato é que os estudos para a produção de energia são deficientes e políticos, quando deveriam ser científicos.

Você tem acompanhado o caso da terra indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima? Como você encara a questão de reservas indígenas em zona de fronteira?
As zonas de fronteira estão abandonadas porque o Exército não está em nenhuma delas é está mal equipados. Saiu uma reportagem na Veja, outro dia, dizendo que eles estão trabalhando com fuzis de 40 anos. No Acre, por exemplo, existe uma invasão de madeireiros peruanos e todo mundo sabe e ninguém faz nada. O que está acontecendo com os arrozais (na Raposa Serra do Sol), com as terras cultivadas, é que há uma lei que precisa ser cumprida. Eu acho que essas pessoas (os agricultores) têm que ser alocadas para a terra que o poder público está cedendo a elas, já que a Raposa Serra do Sol é uma reserva indígena. Se não se levar a lei rigorosamente a sério, se a Constituição não é considerada num item, ou em outro item, como é que ela pode ser respeitada como Constituição única, como a carta magna do país? Ela tem que ser respeitada sempre. O que está acontecendo lá, mais uma vez, são políticos tentando se envolver com um assunto que não é político. A lei é clara. Aquilo é uma reserva indígena. O Movimento Amazônia Para Sempre defende o respeito à Constituição.

Vale à pena construir rodovias na Amazônia?

A única solução para você atingir as distantes populações da Amazônia sem interferir na floresta amazônica são as ferrovias, porque você dá acesso à população para se movimentar, você escoa a produção sem invadir a floresta, como acontece com as rodovias e já aconteceu no resto do país. A gente vê que as nossas estradas estão abandonadas em todo o país, estradas que ligam cidades importantes, estradas que escoam as maiores produções brasileiras estão abandonadas, como é que se vai pensar em construir outras no meio de uma floresta que seis meses por ano é alagável? A Transamazônica até hoje é uma estrada que não existe, com seus seis meses em que não pode ser utilizada, e que não trouxe nenhum benefício; a estrada continua um projeto. Apesar de uma ferrovia sair muito mais caro do que uma rodovia, se conseguiria financiamento muito mais facilmente, do Bird (Bando Mundial) ou de qualquer outro órgão, desde que visando a proteção da floresta. O mundo inteiro concorda, hoje, que a proteção da floresta é a coisa mais importante do planeta.

A Manaus-Porto Velho e a Santarém-Cuiabá estão nesse contexto?

Sim.

No seu périplo pelo continente Amazônia, qual foi a maior reivindicação que você viu no rosto do povo amazônida?

O amazônida quer a preservação da floresta, mas não sabe como a preservação vai levar melhorias para a sua vida. São 22 milhões de habitantes que, como todos os humanos, querem ter uma vida melhor, acesso à água encanada, a esgoto, à saúde, ao bem estar, à educação. É latente na população essa vontade de preservar o que ela conhece, mas ela não sabe, na realidade, como aquilo vai trazer um benefício real para ela. A Amazônia tem que se desenvolver e dar condições da população se desenvolver também.
Quando começou seu interesse pelo meio ambiente?
Desde que era pequeno. Tive uma avó que era apaixonada pelo meio ambiente numa época em que ninguém falava nisso. Ela me mostrava os animais, os insetos, as árvores, a natureza. E há 20 anos faço um trabalho com espécies em extinção na minha casa para restituição à natureza, mas o movimento da Amazônia em si foi quando, gravando a minissérie Amazônia, de Galvez a Chico Mendes (2007), da Rede Globo, alguns atores começaram a perceber que era um desperdício o que estava acontecendo na floresta. A gente via árvores sendo derrubadas, aquela fumaça de queimada dias e dias. Todos os atores que estavam gravando lá estavam indignados. Então resolvemos começar um movimento, uma vez que nós temos acesso ao público, acesso aos meios de comunicação. E foi aí que começou, há um ano e três meses, o Juca de Oliveira escreveu o manifesto e a Cristiane Torloni e eu começamos a levar o movimento para a frente, indo a programas de televisão, anunciando sempre que possível o manifesto, que foi traduzido em três línguas, caso estrangeiros queiram assiná-lo, o que também pode; aliás existem 200 mil assinaturas que vieram de fora do país, mas que não serão computadas no abaixo-assinado de 1 milhão de assinaturas, ou seja, serão 1.200.000 assinaturas, mais ou menos, o que tem tomado muito o nosso tempo. Eu tenho viajado, o último ano, pelo Brasil todo, fazendo reuniões com ONGs, governo, povos da floresta, tenho acompanhado ações no Rio de Janeiro, Brasília, Belém, Manaus, Acre, no sul do país. Que o movimento crie nos brasileiros a sensação de que nós podemos defender a floresta.

Mas parece até que o governo brasileiro quer perder a Amazônia..

A Amazônia é meio abandonada; é muito necessária, muito querida, mas, como o Acre foi no passado, sabe-se que tem-se que ocupá-la, sabe-se que tem-se que tomar conta dela, mas dá um trabalho! A Amazônia precisa ser vista como a rainha brasileira; o grande futuro do Brasil está na manutenção dessa floresta.

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